segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Comissão Jurídica chumba proposta da CEAFO para ouvir Carlos Burgo 27 Fevereiro 2012

 

O presidente da Assembleia Nacional, Basílio Mosso Ramos, deve fazer cumprir a qualquer momento o parecer da Comissão Especializada de Assuntos Jurídicos, Direitos Humanos e Comunicação Social (CEAJDHCS) sobre quem deve requerer ou realizar a audição ao governador do Banco de Cabo Verde. A deliberação, que foi produzida na sequência do impasse entre as bancadas do PAICV e do MPD devido a interpretações divergentes sobre o Regimento da Assembleia Nacional (RAN), vai no sentido de anular a decisão tomada por três dos sete membros da Comissão Especializada dos Assuntos Financeiros e Orçamento (CEAFO) que, na semana passada, pretendia ouvir Carlos Burgo sobre a situação económica do país e a credibilidade das instituições financeiras nacionais, na sequência do caso Lancha Voadora.

Comissão Jurídica chumba proposta da CEAFO para ouvir Carlos Burgo
Os partidos da área do poder não se entendem sobre quem deve convocar e ouvir o governador do BCV em sede parlamentar. Chamada a clarificar as águas, a Comissão Especializada dos Assuntos Jurídicos, Direitos Humanos e Comunicação Social já produziu, segundo o seu presidente, Clóvis Silva, um parecer jurídico que chumba a primeira iniciativa tomada neste sentido. O documento manda anular a decisão tomada por três dos sete membros da Comissão Especializada de Assuntos Financeiros e Orçamento (CEAFO) que pretendia, a 13 de Fevereiro último, ouvir Carlos Burgo sobre a situação socioeconómica do país e a credibilidade das instituições financeiras nacionais, mormente dos bancos sobre os quais recaem suspeitas de envolvimento em lavagem de capitais.
Silva pontua que a CEAJDHCS foi chamada a intervir no processo através do presidente da Assembleia Nacional, mas a pedido do líder da bancada do PAICV, José Manuel Andrade. “Todas as bancadas estão de acordo que o parlamento deve ouvir o governador do Banco de Cabo Verde no tocante aos aspectos referidos. Mas os dois partidos fazem uma interpretação diferente do estabelecido no RAN sobre a matéria em causa. Urge portanto clarificar essa situação para garantir que a decisão que vier a ser tomada terá uma sustentação jurídica correcta”, avança Clóvis Silva.
O deputado tambarina garante que o relatório final da CEAJDHCS será de cumprimento obrigatório, tendo já sido remetido – ontem, 23 – ao presidente da Assembleia Nacional. Basílio Ramos deverá, por isso, reencaminhá-lo, em breve, a todos os deputados e demais comissões especializadas da AN, para os devidos efeitos.
Clóvis Silva faz questão de realçar que o poder de convocar uma reunião e propor a ordem do dia de qualquer comissão especializada do parlamento não é igual ao poder de requerer ou realizar audições parlamentares. O eleito lembra que às Comissões Especializadas compete apenas propor e definir, em reuniões com a presença de todos os seus membros, o âmbito das audições. Silva sustenta esta sua argumentação na alínea e) do artigo 47º do RAN. “As comissões podem requerer ou proceder a quaisquer diligências necessárias ao bom exercício das suas funções, nomeadamente… realizar audições parlamentares”. Para o entrevistado deste jornal, tal poder só pode ser exercido em plenária e nunca como iniciativa do presidente ou de um terço dos membros.

Minoria e lavagem de capitais

A proposta inicial de ouvir o governador do BCV no parlamento partiu da presidente da CEAFO, sem reunir todos os membros daquele organismo. Orlanda Ferreira contou com o aval favorável de apenas dois colegas do MpD, membros da mesma comissão. O objectivo era sobretudo debater e clarificar as suspeitas de envolvimento de alguns bancos cabo-verdianos na lavagem de capitais, no âmbito do dossier Lancha Voadora. Um caso que abrange ainda o ex-presidente da Bolsa de Valores de Cabo Verde (Veríssimo Pinto), que se encontra em prisão preventiva na cadeia central de São Martinho. A audição proposta tinha também como propósito conhecer os dados concretos do BCV relativos à realidade económica nacional face ao impacto negativo que a crise financeira internacional está a ter no arquipélago cabo-verdiano.

Janine Lélis - Direito da Minoria

Orlanda Ferreira justifica que a deliberação da comissão foi tomada antes da reunião da Comissão de Assuntos Jurídicos, Direitos Humanos e Comunicação Social. E, negando tecer mais comentários, sobre a decisão da CEAJDHCS, considera que o relatório deve ser respeitado e cumprido por todas as comissões especializadas.
Para parlamentares da oposição, a CEAFO propôs ouvir o governador do BCV, nos termos dos nºs 1 e 2 do artigo 42º do Regimento da Assembleia Nacional. “1. As reuniões de cada comissão são marcadas pelo seu presidente, por iniciativa própria ou a pedido de um terço dos seus membros, sendo a ordem do dia fixada pelo presidente, ouvidos os representantes dos grupos parlamentares. 2. Quando a convocação da reunião for pedida por um terço dos membros da comissão, cabe a estes propor a ordem do dia”, estabelecem as cláusulas referidas.
Janine Lélis, a porta-voz dos representantes do MpD junto da CEAFO, defende que a decisão foi tomada de forma legal. “Entendemos que é a prerrogativa do presidente ou de um terço dos membros de qualquer Comissão Especializada marcarem a reunião e definirem a ordem do dia daquele organismo. É um direito que não está sujeito a confirmação nem a aceitação dos outros elementos da comissão por se tratar de um direito potestativo, que visa garantir o direito da minoria”, conclui Lélis.
Seja como for, o mais certo é que a Comissão Especializada de Assuntos Financeiros e Orçamento voltará a reunir-se para, desta vez na presença de todos os seus membros, deliberar sobre a audição a ser feita ao governador do Banco de Cabo Verde, em data ainda não definida. Uma iniciativa que está viabilizada à partida, porque tanto o MpD como o PAICV já fizeram saber que estão interessados em ouvir os esclarecimentos de Carlos Burgo no parlamento, em especial sobre as alegadas conexões entre alguns bancos e o caso Lancha Voadora.

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