O facto de um tanquer grego quase pirata, com bandeira liberiana e sem registo conhecido em Cabo Verde estar a abastecer em combustível em alto mar, aos barcos que passam em águas cabo-verdianas, está a agitar o sector marítimo e portuário da ilha de S. Vicente. O petroleiro de nome Dilos pertence à companhia grega Aegean, e foi contratado pela Enacol para prestar serviço de “bunkering” dentro e fora das águas portuárias de S. Vicente mas, segundo o próprio Instituto Marítimo e Portuário, está a transgredir em toda a linha as leis do país: não tem licença comercial para operar em Cabo Verde, não tem licença comercial. O navio detém uma autorização provisória mas, segundo o presidente do IMP, não tem pago as taxas alfandegárias, portuárias e de agenciamento. O Instituo Marítimo e Portuário já accionou um processo de contra-ordenação.
Um temporal poderá cair sobre o petroleiro Dilos ancorado na baía do Porto Grande desde meados de Fevereiro, para exercer o serviço de bunkering às embarcações que sulcam os mares de Cabo Verde, com base num acordo comercial rubricado entre a petrolífera Enacol e a companhia grega Aegean. A intenção é que o petroleiro forneça os navios contactados pela Aegean - uma das maiores empresas abastecedoras de combustível no mundo -, tanto nas águas portuárias como no mar alto, só que essa actividade está a levar muita gente a torcer o nariz. A começar pelas agências de navegação, que se sentem lesadas com os procedimentos alegadamente adoptados pela Enacol. A própria Shell mostra-se também preocupada com a presença do tanquer em S. Vicente e já pensa em revidar esse “golpe” da concorrência.
A denúncia pública deste caso partiu de agências de navegação que acusam a Enacol de driblar a lei do agenciamento e de prejudicar a actividade económica marítima na cidade do Mindelo, ao fornecer combustível a barcos no mar alto, usando o petroleiro. “Isso impede os navios de entrarem no porto, o que traz prejuízos financeiros para o Porto Grande, o IMP, a Alfândega e as agências de navegação. Os únicos beneficiários são a Enacol e a Aegean”, desabafa um agente de navegação, que se mostra particularmente preocupado com os impactos que esse negócio irá ter na actividade da sua empresa. Salienta que já perdeu clientes à última hora, porque foi informado de que os barcos seriam, afinal, abastecidos em alto-mar pelo tanquer Dilos.
“Há muitos aspectos que podem ser questionados neste caso, um deles é saber se a Enacol, dona da agência Enamar, pode agenciar navios que não pertençam à própria empresa. A resposta é não, mas ela tem vindo a fazer isso, contrariando a lei do agenciamento”, reforça a nossa fonte, que preferiu falar sob anonimato, por medo de represálias. Mas sente que ficar calado vai abalar os alicerces das agências e trazer prejuízos avultados à economia marítima.
A preocupação é tanta que as agências de navegação já levaram o caso ao conhecimento do Instituto Marítimo e Portuário. E é o próprio IMP a reconhecer que a operação pretendida pela Enacol e a Aegean é tão nova como complexa, a diversos níveis. Tão complexa que já provocou várias reuniões entre o IMP, a Enapor e a Alfândega, convocadas especificamente para analisarem o caso.
Barco Pirata
“É uma operação nova, nos moldes em que a Enacol e a Aegean querem operar. Isso tem trazido dúvidas. Efectuamos um encontro com a Enapor e a Alfândega exactamente para tentarmos identificar o enquadramento legal que devemos dar à actividade pretendida para esse petroleiro”, informa o Engº Zeferino Fortes, presidente do IMP, autoridade marítima e portuária em Cabo Verde. Embora a situação ainda esteja a ser avaliada, para o IMP é líquido que “Dilos” terá de ser primeiramente registado em Cabo Verde para poder operar nas nossas águas. Esse passo, acrescenta Fortes, é essencial para que as autoridades cabo-verdianas possam ter jurisdição sobre o petroleiro, que tem, por enquanto, bandeira liberiana.
O expediente para o registo parece que começou a ser efectuado mas, por enquanto, “Dilos” tem estado a operar com base numa autorização provisória emitida pelo IMP, com a condição de que os abastecimentos off-shore sejam analisados caso-a-caso. Isto porque dependem do estado do tempo atmosférico e são efectuados em mar aberto. A autorização passada pelo IMP tem a duração de um mês e foi prorrogada até o dia 25 de Abril.
O problema, segundo o próprio Zeferino Fortes, é que essa unidade naval tem estado a infringir vários procedimentos marítimos, portuários e aduaneiros nas suas operações. Por isso, o IMP já mandou abrir um processo de contra-ordenação, que poderá desembocar na aplicação de uma multa.
“Essa autorização, que fique claro, não substitui as obrigações que têm perante outras entidades competentes. Na reunião que efectuamos com a Enapor e a Alfândega, ficou claro que o navio não tem pago as despesas portuárias, aduaneiras, nem ao serviço de saúde, como fazem as outras embarcações. Não está a cumprir as formalidades legais e isso pode constituir uma contra-ordenação para o IMP”, frisa Zeferino Fortes, para quem as preocupações das agências de navegação têm todo o fundamento. Sublinha que qualquer barco que chega aos portos do país tem de solicitar agenciamento. A Enacol só pode usar a Enamar para trabalhar com os navios pertencentes à própria petrolífera, nada mais. E como o IMP considera que a Enamar infringiu essa regra já foi aberto um processo contra a empresa.
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