Miguel Costa: “Não encontro na história um dirigente máximo do partido a tratar parte dos militantes dessa forma” (entrevista exclusiva) / Política / Detalhe de Notícia
11-8-2011
Miguel Costa: “Não encontro na história um dirigente máximo do partido a tratar parte dos militantes dessa forma” (entrevista exclusiva)
Depois de mais de 30 anos de militância, abandonou o PAICV, em ruptura com o presidente do partido. Miguel Costa, apoiante de Aristides Lima, abre o jogo, explica as suas razões e analisa o actual momento ‘tambarina'.
O que é que esteve na base da sua decisão de abandonar o PAICV?
Os motivos foram muitos. No início, o presidente do partido fez algumas declarações a que não dei grande importância, mas à medida que as coisas foram decorrendo vi que tinha de tomar alguma decisão, independentemente do resultado das eleições.
Não é a primeira vez que o PAICV passa por uma situação destas. O PAICV é um partido forte, ninguém nega isso, e precisa de ter um presidente com capacidade de liderança, e o José Maria Neves tem essa capacidade.
O presidente assumiu a liderança da candidatura do Manuel Inocêncio e foi ele quem começou a lançar todas essas farpas.
Provavelmente, na cabeça dele, poderia ter pensado que o Aristides iria ter 3 ou 4 por cento dos votos e que isso não o iria incomodar. Só que as previsões falharam completamente.
Em vez de confrontarem os outros candidatos, cerraram fileiras contra o candidato Aristides Lima e deixaram o Jorge Carlos Fonseca à vontade.
Parece-lhe possível a união do partido?
Não sei se a união é possível, porque não sei o que é que os outros pensam. Eu, como trinta e tal anos de partido, nunca vivi uma situação semelhante.
Não encontro na história um dirigente máximo do partido a tratar parte dos militantes dessa forma. Tenho a minha maneira de pensar e não reagi de cabeça quente. Vim meditando ao longo desses dias.
Por outro lado, o que me obrigou a tomar essa decisão foi o que vi e ouvi no domingo. Nunca acreditei que o PAICV pudesse fazer boca de urna, pagar a pessoas, dar comida, dar bebidas. Para mim foi uma novidade muito grande.
Não estou a dizer que a candidatura do Jorge Carlos Fonseca não o fez também, porque sei que faz e que fizeram, mas no PAICV nunca acreditei que fosse possível.
Não tenho hipótese de me sentar na mesma mesa com algumas pessoas do partido aqui em São Vicente.
A sua decisão é irreversível?
Claro. Em tudo na vida há um momento em que você termina. Se há reforma para tudo, também os políticos deviam ter uma altura para se reformar.
Estou tranquilo porque preparei alguns jovens aqui em São Vicente e sei que eles não me vão envergonhar.
Nós, os de cabelos brancos, às vezes perturbamos o desenvolvimento da juventude.
Esta divisão interna poderá ter consequências para lá das eleições?
Acho que não deve passar muito daí. A consequência era os deputados do PAICV que estavam com o Dr. Aristides criarem uma nova bancada. Os militantes do PAICV têm uma forma de fazer as coisas que não implica prejudicar o partido ou o Estado.
Eu não acredito que o Felisberto ou que o Sidónio venham a tomar a medida que eu tomo e espero que não o façam, para o bem do PAICV e para bem de Cabo Verde.
Se eu estivesse como deputado, não tomaria esta decisão, precisamente para evitar outras consequências.
Poderá estar a desenhar-se uma corrida à liderança do partido? José Maria Neves afirmou que este é o seu último mandato.
Não acredito que o Dr. José Maria Neves saia. Acho que isso foi um bluff. É claro que já meteu os pés pelas mãos nestes últimos meses, mas acho que pela capacidade que ele tem, pela força que o PAICV tem, se ele concluir algumas obras que fazem muita falta, acho que tem todas as possibilidades de se candidatar e apanhar um quarto mandato.
Eu penso é que ele estava já a pensar que, o Inocêncio vencendo agora, daqui a cinco anos ele próprio iria candidatar-se a Presidente da República. Mas, com toda essa situação que se deu agora, não acredito que o faça. Com tudo isto que se deu, ele não vai dizer ao Inocêncio: "agora encosta-te ali que é a minha vez".
Ele vai continuar e em 2016 vai estar novamente a liderar o partido nas legislativas. A não ser que o Inocêncio perca as eleições. Aí talvez se candidate à presidência.
Ele não vai deixar a política. É o que ele faz e eu acho que faz muito bem, independentemente das asneiras que fez nesses últimos tempos.
Qual será o seu posicionamento na segunda volta das eleições?
Eu peço à população que não siga o meu exemplo, mas eu não vou votar no dia 21 de Agosto.
A minha ida à urna teria muitos significados. Para evitar dúvidas, o meu nome vai ficar em branco.
E qual deverá ser o posicionamento de Aristides Lima?
Eu já conheço o Aristides Lima desde 91. Ele tomará uma decisão que não vai afectar ninguém e vai continuar a dar esse exemplo que democracia e cidadania devem estar de mãos dadas.
É uma pena ele não ter vencido as eleições, porque Cabo Verde ficaria a ganhar.
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