terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Testemunhas ouvidas pela Al Jazira relatam um "massacre"

Aviões militares terão lançado ataque sobre a capital da Líbia


As forças de segurança estarão a atacar os manifestantes que pedem o fim do regime de Muammar Khadafi na capital da Líbia, Trípoli. A estação de televisão Al Jazira adiantou que os protestos estão a ser reprimidos com ataques de aviões militares.
Dois pilotos descolaram de uma base aérea junto a Trípoli e um deles pediu asilo político em Malta Dois pilotos descolaram de uma base aérea junto a Trípoli e um deles pediu asilo político em Malta (Foto: Reuters)
Ahmed Elgazir, um activista de direitos humanos do Libyan News Centre, disse à estação de televisão do Qatar que as forças de segurança líbias estão “a massacrar” os manifestantes em Trípoli no oitavo dia de protestos na Líbia que já causaram a morte de pelo menos 230 pessoas, segundo a Human Rights Watch. A violência já levou esta segunda-feira à demissão do ministro líbio da Justiça, Mustafa Mohamed Abud Al Jeleilde, e de três diplomatas líbios, todos eles também em reacção à dura repressão das manifestações pró-democracia.

Elgazir garantiu à Al Jazira que recebeu um telefonema de uma mulher a relatar um massacre sobre os manifestantes, mas o facto de as comunicações terem sido cortadas impediu a confirmação imediata dessa informação. Mas outra testemunha, Adel Mohamed Saleh, que se identificou como activista político, relatou também uma forte repressão das autoridades. “O que estamos a viver hoje é inimaginável. Aviões e helicópteros estão a bombardear indiscriminadamente uma área e outra. Há muitos, muitos mortos.”

“Isto parece ser um último acto desesperado”, considerou Julien Barnes-Dacey, analista da organização Control Risks Middle East, referindo-se ao regime de Khadafi. “Se estão a bombardear a própria capital, é difícil ver como poderão sobreviver.”

Dois pilotos líbios desviaram os seus aviões para Malta, para onde fugiram depois de terem recebido ordens para bombardear os locais dos protestos, adiantaram à Reuters responsáveis do Governo maltês. Os dois pilotos, ambos coronéis, descolaram de uma base aérea junto a Trípoli e um deles já pediu asilo político em Malta.

Para além dos dois pilotos terão também chegado a Malta, a bordo de helicópteros, sete passageiros provenientes da Líbia que terão nacionalidade francesa e foram interrogados pela polícia.

Em Itália, a antiga potência colonial e o mais importante parceiro económico da Líbia, foi decretado o alerta máximo nas bases aéreas, confirmou o ministro italiano da Defesa, Ignazio La Russa. A decisão está relacionada com o que aconteceu em Malta e o primeiro-ministro Silvio Berlusconi convocou os ministros do Interior, Defesa e Negócios Estrangeiros para debater a situação na Líbia.

Pelo menos 61 pessoas morreram nos confrontos desta segunda-feira em Trípoli, de acordo com a Al Jazira. Os protestos alastraram a diversas cidades horas depois de Saif al-Islam Khadafi, filho do líder líbio Muammar Khadafi, ter aparecido na televisão a prometer reformas e a alertar para o risco de guerra civil caso as manifestações continuem.

“Lutaremos até ao último homem e até à última mulher. Não deixaremos a Líbia para italianos e turcos”, disse Saif, admitindo que a polícia cometeu erros, na maneira como agiu nas ruas, mas criticando também os números de mortes avançados, alegando que são menos, e apontando o dedo à imprensa estrangeira pela imagem do país que tem feito passar.

A violência já causou também algumas demissões no interior do Governo. O ministro da Justiça, Mustafa Mohamed Abud Al Jeleil, demitiu-se em protesto contra o "uso excessivo de violência" das forças de segurança contra os manifestantes, avançou o jornal privado "Quryna". Pouco antes tinham sido noticiadas as demissões de três diplomatas líbios, todos eles também em reacção à dura repressão das manifestações pró-democracia – entre eles o enviado líbio à Liga Árabe, Abdel Moneim al-Honi, que anunciou ir juntar-se "à revolução" e o embaixador da Líbia na Índia, Ali al-Essawi, o qual justificou a sua demissão como um "protesto" contra a violenta acção das autoridades.

Em Tobrouk, junto à fronteira com o Egipto, dez egípcios morreram na sequência de disparos, disse à AFP um médico que tentava atravessar a fronteira para a Líbia, Seif Abdel Latif. Foi a revolta egípcia que levou à queda do Presidente Hosni Mubarak, e a tunisina que derrubou o regime de Ben Ali, que inspiraram estes protestos na líbia para pedir o afastamento de Khadafi, no poder desde 1969.O jornal líbio "Quryna" reportou na sua edição online que protestos anti-Governo estão a decorrer em Ras Lanuf, cidade no Norte da Líbia onde se localiza uma das maiores refinarias petrolíferas do país, com capacidade para produzir 220 mil barris por dia. Segundo o "Quryna", os trabalhadores formaram comités especiais de segurança nas instalações para evitar que as mesmas sejam destruídas.

Nas últimas horas chegaram igualmente relatos de a polícia ter fugido da cidade de Zawiyah, a Oeste de Trípoli, depois de esta ter submergido no caos. Residentes naquela região estão em fuga para a vizinha Tunísia, reporta a AFP citando testemunhas locais.

A situação em todo o país está a tornar-se cada vez mais "confusa", descreve o correspondente da BBC Jon Leyne. Desde as primeiras horas da manhã têm-se sucedido notícias de ataques a edifícios públicos, incluindo o do Parlamento em Trípoli e de uma esquadra em Souk Al-Jamma, nos arredores da capital, supostamente lançados em fogo por activistas pró-democracia.

“Consigo ver a Assembleia do Povo a arder. Estão lá bombeiros a tentar apagar o fogo”, descreveu o jornalista. A Assembleia do Povo é o edifício onde reúne o Congresso Popular, o Parlamento, quando está em sessão na capital Líbia.

Moussa diz que reivindicações são "legítimas"

Cada vez mais vozes se juntam hoje às críticas à acção das autoridades na repressão dos protestos: mais recentemente a do secretário-geral da Liga Árabe, Amr Moussa, o qual descreveu as reivindicações dos manifestantes como "legítimas" e instou o regime de Khadafi a pôr termo à repressão violenta das manifestações.

"Estamos perante novas circunstâncias na região, e estas circunstâncias exigem conversações e não o confronto", sublinhou Moussa, expressando a "profunda preocupação" da Liga Árabe com o que se passa na Líbia. "Seguimos os acontecimentos com enorme preocupação", reiterou, citado pela agência noticiosa britânica Reuters.

A noite de ontem para hoje fora de novo muito turbulenta nas ruas de Trípoli, com relatos de tiros a serem disparados em várias zonas da cidade pouco após a transmissão nas televisões do discurso do filho do líder líbio. Segundo a Al-Jazira, ouviram-se constantes disparos, incluindo de armas pesadas, junto à Praça Verde, epicentro da contestação na capital líbia e onde os manifestantes anti-Governo foram brutalmente reprimidos.

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